retira
um pacote de chá do armário.
enche a chaleira com água até cima.
pousa-a no mármore do armário de cozinha
e liga a tomada à ficha incrustada na parede.
ao fim de breves minutos
a água começa a ferver.
num tabuleiro de madeira castanho,
coberto por um pano branco
bordado à mão,
sou conduzida para a sala.
em seguida, senta-se no sofá.
estende a mão para o comando à distância:
um silvo no écran da televisão e
a imagem surge.
a princípio brutal, depois
imobilizada no rosto de uma mulher.
aguardo.
cuidadoso, como alguém
habituado a cumprir um ritual solitário,
aproxima o bule e
o chá desce sobre mim.
com a mão direita
leva-me até aos seus lábios.
repete este gesto uma e outra vez.
lá fora, a noite continua
o seu trabalho de demolição:
a tinta azul da porta
será a primeira a ressentir-se
do frio.
Jorge Gomes Miranda, o autor, nasceu no Porto, Portugal, em 1965 (conservei a pontuação e letras minúsculas, como está no original).
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