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quinta-feira, 23 de março de 2017

Consistência do chá

Sempre que eu amo alguém eu faço chá. Quando eu digo que amo não quero dizer que amo, meu amor é diferente, é como o amor das pessoas que bebem chá de maracujá: calmo, quieto, e preguiçoso. Eu amo as mulheres como bebo uma xícara de chá quente: devagar e intenso. Coloca o sachê na xícara, derrama a água fervida, coloca açúcar e mexe. Isso, mexe. 
Essa é uma prosa sobre uma mulher que enquanto mexia seu chá, mexia seu corpo todo, e sobre eu, que só queria ser aquela colher. Toma cuidado pra não queimar a boca, moça, me bebe devagar. Mexe mais um pouco.
Chá de camomila a gente toma quando tá doente, e como o chinês da Tiê diz enquanto toma seu chá verde: “fica feliz que vai funcionar”. Me diz, você ta feliz assim? 
Eu devia ter escrito um poema, mas eu estava preparando um chá inglês, porque meu chá gelado de limão acabou, e pensei em quando eu quebrei uma das minhas canecas favoritas. Aquela outra moça se preocupou tanto com a minha caneca. A maioria das pessoas teriam ignorado e continuado a tomar seus chás pretos e fortes. 
O chá de hortelã é tão leve quanto porcelana. Quando chove eu tomo chá de morango, e tomo chá mate gelado para sobreviver de manhã. 
Mas a verdade é que enquanto aquela moça mexia seu chá de camomila e seu corpo, eu não pensava em ser colher, eu tava é pensando em chá gelado de pêssego. A consistência do chá se baseia em nossas vidas, meu chá ficou aguado.

LÊ FRANÇA

Crônica publicada originalmente no blog: https://cronicasamorasdohomemquevegeta.wordpress.com

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